O Terceiro Setor é marcado por entidades de natureza privada, sem fins lucrativos, que exercem atividades de interesse social e coletivo e que, por isso, recebem incentivos do Estado dentro da atividade de fomento. São conhecidos por entes de cooperação ou entidades paraestatais, porque colaboram ou cooperam com o Estado no desempenho de atividade de interesse coletivo, embora não integrem a Administração Pública.
Deste modo, as entidades do terceiro setor são pessoas jurídicas de direito privado que, sem fins lucrativos, realizam projetos de interesse do Estado, prestando serviços não exclusivos e viabilizando seu desenvolvimento. Sujeitam-se a controle pela Administração Pública e pelo Tribunal de Contas. O regime jurídico é predominantemente privado, contudo parcialmente derrogado por regras de direito público.
Compreendem os serviços sociais autônomos, as entidades de apoio, as organizações sociais, as organizações da sociedade civil de interesse público e, atualmente, as denominadas “parcerias”. Não há uniformidade terminológica no enquadramento dessas entidades.
Serviços sociais autônomos
Os entes de cooperação são pessoas de direito privado, criados ou autorizados por lei, geridos em conformidade com seus estatutos, geralmente aprovados por decreto, podendo ser subvencionados pela União ou arrecadar em seu favor contribuições parafiscais para prestar serviço de interesse social ou de utilidade pública, sem, entretanto, figurarem entre os órgãos da administração direta ou entre as entidades da indireta. Não possuem fins lucrativos, sendo mantidos por dotações orçamentárias ou por contribuições parafiscais.
Essas pessoas jurídicas podem ser constituídas por meio de instituições particulares convencionais (fundações, sociedades civis ou associações), bem como estruturas peculiares previstas em lei específica. Elas não gozam de privilégios administrativos, fiscais ou processuais.
O entendimento majoritário é que não gozam da imunidade recíproca, que só é aplicável às pessoas jurídicas de direito público, embora, considerando que se dedicam às atividades de assistência social e educação para o trabalho, sem finalidades lucrativas, beneficiam-se do art. 150, VI, “c”, CF: “é vedado à União, Estados, Distrito Federal e Municípios instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.
Nesse sentido, necessário retomar os conceitos de competência e capacidade tributária. Competência é aptidão para instituir tributos, concedida pela Constituição Federal para os entes políticos e indelegável. A capacidade tributária ativa é aptidão para cobrar tributos, admitindo delegação. A delegação é denominada parafiscalidade, que poderá ser realizada para pessoas de direito público e privado perseguidoras de interesses públicos, como os serviços sociais autônomos.
Majoritariamente, o entendimento é que estão sujeitos à licitação, pela possibilidade de arrecadação de tributos e, consequentemente, sujeitos a controle pelos órgãos especializados.
Súmula 516/STF: O Serviço Social da Indústria (Sesi) está sujeito à jurisdição da Justiça estadual.
O STJ afastou a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem do polo passivo de ações judiciais de repetição de indébito em que são partes o contribuinte e a União.
O regime de pessoal dos serviços sociais autônomos é da CLT e não estão sujeitos a concurso público, vez que não integram a AP indireta. Atos de seus dirigentes são passíveis de mandado de segurança, ação popular, improbidade administrativa e são fiscalizados pelo Tribunal de Contas.
Entidades de apoio
São pessoas jurídicas de natureza privada que exercem, sem fins lucrativos, atividade social e/ou serviços sociais não exclusivos do Estado, relacionados a ciência, pesquisa, saúde e educação. Não compõem a Administração Pública indireta, embora atuem junto a hospitais e universidades públicas.
São instituídas diretamente por servidores públicos, em nome próprio e com recursos próprios, para exercerem atividades de interesse social relativas aos serviços prestados pelas entidades estatais em que os servidores atuam. Recebem fomento do Estado, quer por meio de dotações orçamentárias, quer por meio de cessão provisória de servidores públicos ou por permissão provisória de uso de bens públicos.
São geralmente instituídas sob a forma de fundação de natureza privada, mas podem ser instituídas também sob forma de associação ou cooperativa. Constituída tal pessoa jurídica, a cooperação com o Estado se faz por convênios.
Doutrinariamente, não se sujeitam a regime jurídico-administrativo, vez que prestam atividade de natureza privada. Seus contratos são de natureza privada, celebrados sem licitação, e seus empregados são celetistas, contratados sem concurso público.
Crítica: não seguem regime público, mas podem receber dotação orçamentária, servidor e bens públicos, o que pode ser forma da Administração Pública fugir do dever de licitar e realizar concurso público. Não há disciplina legal específica.
Sendo assim, devem ser constituídas na forma de fundações de direito privado, sem fins lucrativos, e regidas pelo Código Civil brasileiro. Sujeitam-se à fiscalização do MP, legislação trabalhista e devem realizar registro e credenciamento nos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia. Não são criadas por lei e nem mantidas pela União.
Organizações sociais
São as OS, pessoas jurídicas de direito privado, não integram a Administração Pública, não têm fins lucrativos e são criadas por particulares para a execução, por meio de parcerias, de serviços públicos não exclusivos do Estado, previstos em lei.
Suas atividades são acessíveis aos próprios particulares, independente de intervenção estatal. Atuam em nome próprio, sob regime de direito privado, mas recebem apoio estatal (fomento).
Estados e Municípios podem criar OS, desde que aprovem suas leis próprias. As possíveis finalidades desenvolvidas pelas OS se resumem na busca do bem comum, prestando serviços ligados a pesquisa e ensino científico, desenvolvimento tecnológico, meio ambiente, cultura e saúde, não se admitindo outras finalidades estatutárias. Por isso, são declaradas como entidades de interesse social e utilidade pública.
São livremente qualificadas pelo Ministério ou titular de órgão supervisor do seu ramo de atividade e pelo MPOG, desde que preencham requisitos formais. Afasta-se o dever de licitar para o credenciamento a fim de aquisição do título de organização social: não há competição, todos os interessados podem alcançar o mesmo objetivo. A conclusão do procedimento de qualificação depende de aprovação, discricionária, do Ministro ou titular de órgão supervisor ou regulador da área de atividade (Poder Executivo). A AP deve decidir conforme a principiologia constitucional (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência)
O vínculo jurídico é o contrato de gestão, que não se confunde com concessão de serviço público, vez que não tem por objeto a atribuição a particulares da prestação de serviço público, por conta e risco próprios. Há divergência doutrinária em que se entende tratar de convênios, vez que os interesses dos que o celebram são convergentes.
Na celebração do contrato de gestão, observar os princípios constitucionais da Administração Pública. Além da especificação do programa de trabalho, metas, prazos e critérios de avaliação e desempenho. São entidades que podem receber dotações orçamentárias, bens públicos mediante permissão de uso e cessão de servidores públicos, razão pela qual prestam contas à Administração Pública e ao Tribunal de Contas, submetendo-se também às regras de improbidade administrativa.
Os empregados das OS não são servidores públicos, mas sim empregados privados. A seleção de pessoal não segue rigores do concurso público, mas sim critérios objetivos e impessoais. Os servidores públicos cedidos preservam a remuneração do cargo de origem.
Não se afasta o controle do Tribunal de Contas e as OS estão submetidas a sancionamento por improbidade administrativa, caso façam mau uso de recursos públicos.
Há dispensa de licitação para que a Administração Pública contrate com as OS. Contudo, em razão de desvios de dinheiro público, a doutrina pede cautela na interpretação dessa regra. Contratos a serem celebrados pela OS com terceiros, com recursos públicos, devem ser conduzidos de modo público, objetivo e impessoal, observando os princípios do art. 37, caput, CF, e nos termos de regulamento próprio a ser editado pela entidade.
A qualificação “organização social” é temporária, enquanto vigente o contrato, sendo possível a desqualificação por meio de ato do Poder Executivo, exigindo processo administrativo e contraditório.
Organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP)
Pessoa jurídica de direito privado, instituída por particular, sem fins lucrativos, para prestar serviços sociais não exclusivos do Estado, sob incentivo e fiscalização estatal. Atua nas mesmas áreas que as OS, além de atuar também em outras previstas no art. 3º, Lei 9.790/99: As finalidades da OSCIP são assistência social, cultura, proteção ao patrimônio histórico e artístico, meio ambiente, desenvolvimento econômico e social, combate à pobreza, etc. Possível também estudos e pesquisas para desenvolvimento, disponibilização e implementação de tecnologias voltadas à mobilidade de pessoas, por qualquer meio de transporte.
Não é passível de qualificação como OSCIP sociedades comerciais, sindicatos, instituições religiosas, empresas que comercializam planos de saúde, hospitais privados, escolas privadas, cooperativas, OS, partidos políticos.
Firma-se termo de parceria com o Estado, por ato vinculado, discriminando direitos, responsabilidades e obrigações das partes, previsão de receitas, obrigação de apresentar relatórios, etc. É necessária habilitação junto ao Ministério da Justiça para a qualificação de OSCIP. É pessoa jurídica que ganha esse status temporário, durante o termo de parceria (mínimo 3 anos).
Não há proibição de que servidores que participarem dos conselhos da OSCIP recebam contraprestação pela atividade. Antes havia vedação expressa no art. 4o, parágrafo único, Lei 9.790/99.
Diferenças entre OS e OSCIP:
(i) OS são usadas para substituir órgãos que foram extintos, de modo discricionário, por meio de contrato de gestão, por meio do qual podem receber recursos orçamentários e bens públicos, bem como servidores.
(ii) OSCIPS têm objetivo de cooperar com o Estado, que também desempenha a atividade e faz análise rigorosa de requisitos. O Poder Público não participa de seus quadros diretivos. Seu vínculo é estabelecido pelo termo de parceria. Legalmente não há previsão expressa para recursos orçamentários, apesar de a lei estabelecer a possibilidade de recursos públicos que serão liberados em conta bancária. Não há previsão para cessão de bens e servidores.
Organização da sociedade civil
Previamente denominada ONG, com a Lei 13.019/14 há novo marco regulatório. Podem ser organizações da sociedade civil:
a) entidade privada sem fins lucrativos que não distribua resultados, sobras, excedentes, dividendos, isenções, parcelas do patrimônio, entre sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais, e que os aplique integralmente na consecução do objeto social de modo imediato ou por meio de fundo patrimonial ou de reserva;
b) sociedades cooperativas, sociedades integradas por pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade social, sociedades alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e geração de trabalho e renda, sociedades de fomento, educação e capacitação de trabalhadores rurais.
c) organizações religiosas que se dediquem a atividades ou a projetos de interesse público e de cunho social distintas das destinadas a fins exclusivamente religiosos.
A Lei 13.019/14 instituiu o marco regulatório das OSC, criando as parcerias voluntárias. Tem como objetivo transformar a democracia representativa também em democracia participativa, com a incorporação das OSCs nas políticas públicas. Para tanto, inicialmente a parceria foi denominada parceria voluntária. O conceito pode ser parceria ou parceria voluntária, eis que a essência do instituto se manteve, em que pese a Lei 13.204/15 tenha retirado a expressão “voluntária”.
Estão impedidas de celebrar qualquer parceria as OSCs que não estejam regularmente constituídas ou, se estrangeiras, não estejam autorizadas a funcionar no território nacional. Além disso, há várias outras previsões legais de evitação: contas rejeitadas nos últimos 5 anos, punição com sanção de suspensão de participação em licitação e impedimento de contratar com a AP, dirigentes com contas irregulares ou rejeitadas pelo Tribunal de Contas em qualquer esfera da Federação, nos últimos 8 anos...
A parceria é conjunto de direitos, responsabilidades e obrigações decorrentes da relação jurídica entre AP e organização da sociedade civil, em regime de cooperação, mediante projeto expresso em termo de colaboração, em termo de fomento ou acordo de cooperação.
São as atividades para fins de parcerias: conjunto de operações que se realizam de modo contínuo ou permanente, das quais resulta produto ou serviço necessário à satisfação de interesses compartilhados pela AP e pela OSC.
Tais parcerias são formalizadas mediante celebração de termo de cooperação, termo de fomento, que requerem chamamento público, e o atual acordo de cooperação. Haverá procedimento de manifestação de interesse social, edital de chamamento público publicado com antecedência mínima de 30 dias, com programação orçamentária que autoriza e viabiliza a celebração da parceria, etc. O termo de colaboração é o instrumento pelo qual são formalizadas as parcerias estabelecidas pela AP com OSC para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, com transferência de recursos financeiros. O termo de fomento é instrumento para as parcerias destinadas à consecução de finalidades de interesse público e recíproco propostas por iniciativa das OSC que envolvam transferência de recursos. Para esses 2 há chamamento público. O acordo de cooperação não envolve transferência de recursos.
Em seguida, há julgamento da proposta por comissão de seleção previamente designada, vedada a participação de pessoa que, nos últimos 5 anos, teve relação jurídica com alguma das entidades participantes do chamamento público.
Os requisitos para firmar o termo são capacidade técnica e experiência anterior, bem como respectivo prazo de existência: com Municípios, 1 ano; com Estados e Distrito Federal, 2 anos; com União, 3 anos.
A Administração Pública poderá dispensar a realização do chamamento público no caso de urgência decorrente de paralisação de atividades de relevante interesse público por até 180 dias, nos casos de guerra, calamidade pública, grave perturbação da ordem ou ameaça à paz social, quando tratar-se de programa de proteção a pessoas ameaçadas ou em situação que possa comprometer sua segurança, ou quando forem atividades voltadas para educação, saúde, assistência social realizada por OSC previamente credenciada pelo órgão gestor da respectiva política.
Ainda, é inexigível quando o objeto da parceria for previsto em compromisso internacional e quando a parceria decorrer de transferência para a OSC autorizada em lei.
Poderá haver impugnação da justificativa de dispensa / inexigibilidade em 5 dias. Caso haja fundamentos, o ato será revogado (deveria ser anulado) e o chamamento público será iniciado.
As medidas para execução e eficiência da parceria são planejamento, regras para execução (transparência e credibilidade), monitoramento e avaliação, prestação de contas, responsabilidade e sanções.