sexta-feira, 19 de junho de 2020

Atos Administrativos - parte 1

Dada a extensão do assunto "atos administrativos", tanto doutrinária quanto jurisprudencialmente, quebrei o post nas seguintes seções: parte 1, relacionado à introdução e elementos dos atos administrativos; parte 2, relacionado às características dos atos administrativos; parte 3, com a classificação dos atos administrativos; parte 4, controle judicial e extinção dos atos administrativos.


INTRODUÇÃO

Ato jurídico e ato administrativo têm diversos pontos em comum, tais como sujeito, objeto e forma. O ato administrativo, todavia, recebe qualificações especiais – o sujeito é público, o objeto é preordenado a interesse público, etc. É possível diferenciar ato da administração de ato administrativo com base no entendimento que ato da administração é realizado pelo Poder Executivo e entes da AP Indireta, que podem ser de direito privado ou de direito público: ato privado da Administração Pública (doação, permuta, compra e venda, locação), ato material (demolição de casa, apreensão de mercadoria, realização de serviço) e ato administrativo. Ademais, ato administrativo pode ser realizado pelo Poder Executivo, bem como pelos Poderes Legislativo e Judiciário. Ato administrativo é manifestação de vontade do Estado ou de quem o represente (concessionárias, permissionárias, etc) que cria, modifica ou extingue direitos para a satisfação do interesse público, sujeito ao regime jurídico público, inferior e complementar à lei e sujeito a controle de legalidade pelo Poder Judiciário.

ELEMENTOS / PRESSUPOSTOS / REQUISITOS

Os elementos do ato administrativo, segundo a doutrina majoritária, que utiliza como fundamento a Lei 4.717/65 (Lei de Ação Popular), são: (i) sujeito competente; (ii) forma; (iii) motivo; (iv) objeto; e (v) finalidade:

Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:
a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos;
e) desvio de finalidade.
Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:
a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou;
b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;
c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;
d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;
e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Competência
Sujeito competente para praticar ato administrativo é aquele que exerce função pública e tem sua competência definida em lei, logo competência não se presume. A competência é de exercício obrigatório, isto é, poder-dever, portanto, irrenunciável e imodificável pela vontade do agente. Decorre também que a competência é imprescritível.
O agente competente pode ser particular que exerce função pública, como ocorre com os delegados nos contratos de concessão e permissão, os prestadores de serviços notariais, mesários, etc. Assim, esses atos também podem ser objeto de mandado de segurança e ação popular.
Vício de competência é sanável por meio de convalidação.

Sobre a possibilidade de delegação e avocação de competência, destaca-se que ela pode ser distribuída por órgãos diversos, configurando as hipóteses de procedimento administrativo ou ato administrativo complexo, bem como só podem ocorrer se a lei ou a Constituição autorizar e a situação justificar. A Lei 9.784/99 proíbe a delegação de competência em três circunstâncias: (i) quando a competência é exclusiva; (ii) atos normativos; e (iii) decisão em recurso administrativo:

Art. 13, Lei 9.784/99. Não podem ser objeto de delegação:
 I - a edição de atos de caráter normativo;
II - a decisão de recursos administrativos;
III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.


O ato de delegação exige publicação oficial e deverá especificar matérias e poderes transferidos, transferindo limites, duração e objetivos. Quando ocorre delegação de competência, tanto quem delega quanto quem recebe a competência transformam-se em competentes. Assim, há cumulação de competências.
A avocação se dá quando a autoridade, que inicialmente era incompetente, atrai para a sua esfera a competência. Pressupõe-se sistema de hierarquia e inexistência de competência exclusiva.

Forma
“Forma é o revestimento exterior do ato; portanto, o modo pelo qual este aparece e revela sua existência”; “formalização é a específica maneira pela qual o ato deve ser externado”. A forma do ato administrativo deve seguir o previsto em lei.
Para realizar o ato administrativo, o administrador precisará exteriorizar a sua vontade. Essa manifestação de vontade não poderá se dar de qualquer forma, mas deverá observar as formalidades específicas de cada ato. A exigência geral é que o ato seja feito por escrito, mas é possível que seja feito oralmente (ex: contrato de pronta entrega ou pronto atendimento de valor até R$ 4.000,00 – art. 60, parágrafo único, Lei 8.666/93; sinal do guarda de trânsito para que a pessoa pare).
Além de ser por escrito, a Lei pode dar exigências específicas para cada ato (formalidades próprias). Em vista disso, para o ato administrativo, quanto à forma, aplica-se o princípio da solenidade.
Defeito na forma, em algumas circunstâncias, representa mera irregularidade sanável, o que ocorre quando o vício não atinge qualquer esfera de direito, e deve ser convalidado. Em outras hipóteses, os vícios de forma são insanáveis, porque afetam o ato em seu próprio conteúdo. Podem gerar invalidação.
É jurisprudência do STJ que se o ato administrativo vai atingir alguém, esse sujeito tem que ser chamado a participar da construção do ato – esse é o requisito do procedimento administrativo prévio. Portanto, para a prática de um ato administrativo é preciso observar um procedimento administrativo prévio – exigência de forma do ato administrativo, observando contraditório e ampla defesa.

Finalidade
Finalidade é o bem jurídico objetivado pelo ato. Em outras palavras, é o objetivo inerente à categoria do ato. Se o ato administrativo é praticado com um interesse que não é o interesse público, ele terá um defeito, chamado de desvio de finalidade (vício subjetivo – defeito na vontade).

Motivação
Motivação exprime, de modo expresso e textual, as situações de fato que levaram o agente à manifestação de vontade. São as razões que levaram à prática do ato. Na motivação o administrador realiza uma correlação lógica entre os elementos do ato e a previsão legal.
O silêncio administrativo (falta de resposta do administrador) é um nada jurídico, não produzindo nenhum efeito, salvo quando a lei atribuir efeitos a esse silêncio (ex: existe lei que determina que o administrador deverá responder em 15 dias e, caso não responda, entende-se que a resposta é afirmativa).
Ademais, motivo é o fato e o fundamento jurídico que levam à prática do ato. Diferença entre motivo e motivação: motivo é a enumeração dos dispositivos legais que fundamentam a atuação da AP, enquanto que motivação é raciocínio que faz correlação entre os elementos do ato e a previsão legal.
Requer-se 3 aspectos referente ao motivo do ato: (i) o motivo deve ser verdadeiro e compatível com a realidade fática; (ii) o motivo existente deve corresponder com o motivo previsto em lei; (iii) a legalidade do motivo exige a congruência entre o motivo existente e declarado no momento da realização do ato com o resultado prático obtido.
A teoria dos motivos determinantes vincula o administrador ao motivo declarado. Essa vinculação acontece mesmo em ato administrativo excepcional que não dependa de motivo. Utilizando a teoria dos motivos determinantes, é possível concluir que se o administrador fizer uma exoneração ad nutum (que não precisa de motivo), mas utilizar um motivo para isso (por exemplo, para diminuir despesas), ele ficará vinculado a esse motivo.

“(…) 4. Ao motivar o ato administrativo, a Administração ficou vinculada aos motivos ali expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tem aí aplicação a denominada teoria dos motivos determinantes, que preconiza a vinculação da Administração aos motivos ou pressupostos que serviram de fundamento ao ato. (...)” (RMS 19013/PR, STJ - 5a Turma, Relatora Min. Laurita Vaz, 01.10.2009).

Entretanto, existe uma exceção à teoria dos motivos determinantes: tredestinação legal, que é a mudança de motivo autorizada pelo ordenamento jurídico. Em vez de buscar determinado interesse público, a AP acaba por buscar outro. A tredestinação legal é possível na desapropriação. Exemplo: o administrador desapropria para construir um hospital, mas antes dessa construção, o administrador resolve construir outra coisa. Isso é possível, mas desde que mantida uma razão de interesse público.

Objeto
Objeto do ato administrativo é o resultado prático do ato, é o que o ato faz. Esse objeto deverá ser lícito, possível e determinado.

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